A Cruz: Altar do Amor Consumado
Sexta-feira Santa — Solene Função
Litúrgica da Tarde
18 de abril de 2025
📖Proclamação do Evangelho (Missal de 1962)
omitimos o Evangelho da Paixão conforme a liturgia (Mt 26, 36-75; 27, 1-60); foi proclamado o seguinte, previsto para ser proclamado quando o Sacerdote celebre duas ou três Missas no Segundo Domingo da Paixão (Domingo de Ramos):
Evangelho segundo São Mateus (Mt 27, 45-52) Depois de terem crucificado a Jesus, desde a hora sexta até à nona, houve trevas sobre toda terra. E por volta da hora nona, exclamou Jesus em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lamma sabactháni? Que quer dizer: Deus meu, Deus meu, por que Me abandonaste? Alguns dos que ali estavam e ouviram isto, diziam: Está a chamar por Elias. E logo, correndo um deles, pegou numa esponja, ensopou-a em vinagre, pô-la na ponta de uma cana, e dava-Lhe a beber. Porém, os outros diziam: Deixa ver se vem Elias livrá-lo. E Jesus, soltando de novo um alto brado, rendeu o espírito.
🕯️Meditação Carmelita
A Sexta-feira Santa é o grande silêncio do Amor, o dia em que Deus falou sem palavras, e falou tudo. A Cruz, longe de ser fracasso, é o ápice do dom. Ela é o trono do Esposo, onde Cristo reina com coroa de espinhos, com cetro de cana, com manto de sangue. É ali que o Amor revela sua nudez mais pura.
O Carmelo, lugar de silêncio, deixa-se ferir por esse Mistério, em silenciosa reverência. Tudo silencia diante do Crucificado. O sofrimento já não é mais absurdo: é sacramento. São João da Cruz nos ensina: “O que prova o amor é o sofrimento por quem se ama.” (Ditos de Luz e Amor, n. 63)
Na vida carmelita, a Cruz não é acessório: é morada. Ela é o altar invisível onde a alma se consome lentamente por amor. Santa Teresa d’Ávila, com firmeza materna, exorta: “Fixai os olhos no Crucificado e tudo vos parecerá pequeno.” Ela compreendia que, ao olhar para o Cristo pendente do madeiro, aprendemos o caminho do dom total, da oferta sem reservas. No alto do Calvário, Maria, a Mãe e Rainha do Carmelo, permanece de pé. Ela não se desespera, não grita, não foge. Permanece. Este é o segredo do Carmelo: permanecer com Maria aos pés da Cruz. Lá, o silêncio é oração, o pranto é intercessão, a dor é fecundidade.
São Tito Brandsma, carmelita mártir, entregou-se nos horrores do campo de concentração, afirmando: “Aceitei tudo por amor à Cruz de Cristo. Foi ela quem me salvou.” Sua vida se tornou oferta silenciosa, incenso queimado nas trevas do século XX. Ele não morreu: foi consumado em Cristo. Também a Beata Maria de Jesus Crucificado (Mariam Baouardy), mística do Oriente e estigmatizada, dizia com simplicidade desarmante: “O sofrimento é o beijo do Crucificado. É preciso não recusar este beijo.” Ela compreendeu que a dor aceita por amor se torna comunhão. Na Sexta-feira Santa, o Carmelo não busca compreender, mas amar. Não busca falar, mas calar. Não busca explicar, mas adorar.
A alma carmelita não foge da Cruz: sobe com o
Esposo. E lá, na altura do madeiro, como o discípulo amado, escuta as últimas
palavras e se consome com Ele. Hoje, cada carmelita — no claustro ou no
mundo — é chamado a subir o Gólgota interior, aquele lugar secreto onde
a vontade se rende à vontade do Pai. É ali que se repete, na profundidade do
espírito, o clamor de Jesus: “Consummatum est” – tudo está
consumado. Neste dia de trevas, a
luz não desaparece: ela se esconde na madeira da Cruz. O Altare
Carmelus, altar invisível da alma orante, se une ao Gólgota, ao trono
ensanguentado do Rei. E ali, onde tudo parece perdido, tudo já foi redimido.
📚 Referências
Bibliográficas
São João da Cruz, Ditos de Luz e Amor, n. 63, in: Obras Completas. Edições Carmelo / Vozes.
Santa Teresa d’Ávila, Caminho de Perfeição, cap. 26, Edições Loyola.
São Tito Brandsma, escritos da prisão em Dachau, citação extraída da Ordem do Carmo.
Beata Maria de Jesus Crucificado, ditos espirituais, Carmelo de Belém / OCD.
Evangelho conforme o Missal Romano Tradicional (1962), tradução de Pe. Matos Soares.
Ir. Alan Lucas de Lima, OTC
Carmelita Secular da Antiga Observância