Entre peixes e pecadores: nasce a Igreja

La Pesca miracolosa è un dipinto a tempera su carta (360x400 cm) di Raffaello Sanzio, databile al 1515-1516 e conservato nel Victoria and Albert Museum di Londra. Fa parte dei cartoni per gli arazzi della Cappella Sistina.

4º Domingo depois de Pentecostes
6 de julho de 2025

📜 Introdução

No 4º Domingo depois de Pentecostes, contemplamos Jesus chamando pescadores comuns para uma missão extraordinária: fundar a Igreja. Entre peixes e pecadores, Deus escolhe operar o milagre da graça, mostrando que o Reino nasce na fragilidade humana e na confiança obediente. Nesta cena, percebemos o convite divino para deixar o velho e navegar rumo às águas profundas da fé e da missão. Aqui, entre redes vazias e corações dispostos, começa a história da Igreja.

Evangelho segundo São Lucas 5,1–11: tradução de 1957

Naquele tempo: Estando Jesus junto ao lago de Genesaré, o povo se comprimia ao redor d’Ele para ouvir a palavra de Deus. Vendo duas barcas paradas junto à margem do lago — os pescadores haviam descido delas e lavavam as redes — subiu a uma das barcas, que era a de Simão, e pediu-lhe que se afastasse um pouco da terra. Sentando-se, ensinava da barca o povo.

Quando acabou de falar, disse a Simão: “Faze-te ao largo e lançai as vossas redes para pescar.” Simão respondeu: “Mestre, trabalhamos toda a noite e nada apanhamos; mas, sobre a tua palavra, lançarei a rede.”

E, fazendo assim, apanharam tão grande quantidade de peixes, que a rede se rompia. Acenaram aos companheiros da outra barca, para que viessem ajudá-los. E vieram, e encheram ambas as barcas, de modo que quase afundavam.

Vendo isto, Simão Pedro prostrou-se aos pés de Jesus, dizendo: “Afasta-Te de mim, Senhor, porque sou um homem pecador!” Pois o espanto se apoderara dele e de todos os que com ele estavam, por causa da pesca que haviam feito. E o mesmo aconteceu com Tiago e João, filhos de Zebedeu, companheiros de Simão.

Jesus disse a Simão: “Não temas: de agora em diante serás pescador de homens.” E, levando as barcas para terra, deixaram tudo e O seguiram.

🕯️Meditação Carmelita: “Entre peixes e pecadores: nasce a Igreja”

A cena é simples: homens cansados, redes vazias, o silêncio do lago na madrugada. O trabalho duro da noite, o fracasso que pesa no corpo e na alma. E então Ele chega — Jesus, o carpinteiro da Galileia, que não despreza nem a rotina mais humilde, nem a fadiga mais crua. Entra na barca, senta e fala. Como na vida do Carmelo, onde a aparente quietude esconde a tempestade do espírito, ali também o mistério do Reino começa a se revelar no silêncio da obediência.

Pedro, que logo vai se tornar pedra, é antes um homem comum, cheio de dúvidas, pecador consciente — ele até pede que Jesus se afaste, tamanha a consciência da sua miséria. Que lição para nós, almas carmelitas! O caminho do encontro com Deus não é em nossa pretensa justiça, mas no reconhecimento humilde da própria limitação. Santa Teresa de Ávila já ensinava que “é necessário estar em paz com a própria miséria para poder avançar na graça.” Não fugimos da nossa fragilidade, mas a colocamos diante do Senhor, onde ela se transforma.

A ordem de Jesus para lançar as redes — mesmo depois da pesca vazia da noite inteira — é o chamado para confiar contra toda lógica humana. Duc in altum! Navegar para águas mais profundas, onde só a fé segura as mãos, onde só o Espírito sopra forte. São João da Cruz, em seu poema “No meio do caminho”, fala da noite escura da alma que antecede a luz da união divina. A barca dos pescadores é a barca da Igreja, feita de fraquezas, dúvidas e esperança, onde a graça quebra as redes vazias e traz a abundância.

O chamado a ser “pescador de homens” é convite para a missão que nasce da contemplação e da entrega, do mistério e do serviço. Não é uma aventura heróica, mas uma fidelidade humilde, um abandono que só pode ser fruto de encontro profundo com Aquele que chama. Elias, o profeta que, no Carmelo, simboliza o fogo interior, foi chamado no silêncio, no vento suave, não no estrondo. Assim também somos chamados — no silêncio das redes, na aparente inutilidade do nosso esforço, Deus age e transforma.

Hoje, neste 4º Domingo depois de Pentecostes, somos convidados a olhar para as nossas próprias redes vazias, para as nossas fraquezas e para os momentos em que a esperança parece ter morrido. E, como Pedro, reconhecer: “Senhor, afasta-te de mim, porque sou pecador.” Não para nos afastar, mas para que Ele, misericordioso, venha nos transformar.

Na barca da Igreja, cada um de nós é chamado a lançar a rede da obediência e da fé, mesmo quando a lógica humana grita que tudo está perdido. Porque é entre peixes e pecadores, entre o ordinário e o divino, que nasce a Igreja — viva, pulsante, guiada pelo Espírito, sempre pronta para o milagre.

“Em ti, Senhor, coloco minha confiança, que não se envergonhe o meu coração.” (Salmo 25)

Ir. Alan Lucas de Lima, OTC
Carmelita Secular da Antiga Observância

Referências bibliográficas

ÁVILA, Teresa de. O castelo interior ou Moradas. Tradução de Maria José Cyhlar Monteiro. 3. ed. São Paulo: Loyola, 1999.

CRUZ, João da. Noite escura. Tradução de Ivo Storniolo. 9. ed. São Paulo: Paulus, 2001.

Lefebvre, Gaspart, Dom. Missal Quotidiano: texto em latim-português: segundo as rubricas do Missale Romanum de 1962. Niteroí: Permanência, 2023.

SANTOS DO CARMELO. Compilação de escritos e meditações da Antiga Observância e do Carmelo Descalço. [S.l.]: [s.n.], c. século XVI–XX.